sexta-feira, 26 de dezembro de 2014

Análise literária do livro "Chico Xavier responde"

Análise de José Passini*
Na apresentação do livro "Chico Xavier responde", o médium Carlos A. Baccelli diz que “na condição de espírita e médium, me senti no dever de dar-lhe publicidade, deixando a sua apreciação e análise, no que tange à autenticidade e valor, a quantos se considerem mais habilitados para tanto.”
Não nos consideramos mais habilitado, mas a examinamos não só pelo o direito de exame que nos confere a Doutrina, mas também no cumprimento do dever de contribuir para que o Espiritismo continue a ser essa fonte confiável de informação, de esclarecimento e de equilíbrio.
As obras mediúnicas quase sempre contêm um prefácio explicativo que informa o leitor como elas foram produzidas. Nesse livro não há informação de como se teria processado esse inusitado diálogo: se o médium desdobrou-se e foi à esfera habitada pelo Chico; se este veio até ele para ser entrevistado como se fora um encarnado, ou se foi uma comunicação psicográfica.
Mas, logo à primeira resposta, tem-se a impressão de que se trata de psicografia, exercitada em forma de diálogo, no qual o médium, teria psicografado as respostas, sem dizer como foram feitas as perguntas.
Transcreveremos os trechos da obra, colocando entre parênteses o número da página e, em seguida, faremos nossos comentários em itálico:

— Mas você não era Allan Kardec reencarnado? — E quem vocês pensam que era Allan Kardec? (pág. 9)
Nós temos a inabalável certeza de que Allan Kardec se coloca entre os grandes benfeitores da Humanidade, mas igual certeza temos de que não viria ele comunicar-se, usando do seu precioso tempo e do tempo de um médium para uma conversa informal, sem conteúdo, muito distante das sábias páginas que nos deixou na Codificação. Seria o mesmo que Michelangelo gastando seu tempo em modelar toscas figuras de barro para exibi-las numa feira.

— Com a desencarnação, a linguagem do espírito pode sofrer alguma mudança? — A linguagem, sim; o pensamento, não. Com o passar do tempo e de acordo com o instrumento mediúnico através do qual se manifesta, o espírito não mais se prende a certas peculiaridades que o identificam do ponto de vista do estilo. (pág. 10)
A afirmativa acima parece-nos uma justificativa para o distanciamento do estilo desse Espírito do estilo de Kardec e de Chico. Emmanuel e André Luiz, para não citarmos outros, comunicaram-se durante décadas pelo Chico, conservando o mesmo estilo, fato constatável até mesmo por pessoas não afeitas à literatura.

— O que teria a dizer aos que afirmam que André Luiz fez literatura de ficção? — Que a ficção sempre se antecipa à realidade. (pág. 28)
Vê-se na pergunta o claro intuito de estabelecer um paralelo entre certas obras mediúnicas fantasiosas, redigidas em linguagem vulgar, surgidas ultimamente, com o trabalho extraordinário desenvolvido por André Luiz. Para se ter idéia do valor de sua obra, atentemos às palavras do Irmão Jacob, no livro “Voltei” (22), que transcreve o que ouviu do Espírito que a supervisionava: “Além disto, o esforço dele é impessoal e reflete a cooperação indireta de muitos benfeitores que respiram em esferas mais elevadas.”

— O que diria aos que se consideram donos da verdade? — Diria que nem Jesus quis defini-la. (pág. 28)
O Movimento Espírita tem sofrido ataques constantes através de uma literatura que, pretendendo ser moderna, inovadora, reveladora, tacha de “donos da verdade” os espíritas sérios, zelosos pela preservação da sobriedade, da nobreza e da dignidade da linguagem do que se publica em nome da Doutrina. Deixando de lado esse posicionamento falacioso da pergunta, atente-se para a pobreza e a para a desconexão da resposta colocada na boca do Chico.

— Presentemente, onde se encontraria Amélie Boudet? — Em dimensão Espiritual Superior. (pág. 29)
Resposta óbvia, a uma pergunta sem sentido, no caso de um Espírito como Amélie Boudet.

— E quem foi Hippolyte-Léon Denizard Rivail? — Alguém que, não fossem os Espíritos, teria vivido no mais completo anonimato; um homem comum, como tantos outros que vivem esquecidos dos homens... (pág. 45)
Como poderia ter ficado no anonimato o emérito educador que, já aos 27 anos, fora premiado pela Academia de Arrás pela sua proposta de reforma dos estudos clássicos, tendo publicado obras sobre variados ramos de estudos, sempre visando ao aprimoramento dos processos de educação? Seria um homem comum, esquecido dos homens? Note-se o que dizem Zêus Wantuil e Francisco Thiesen, na sua excelente obra “Allan Kardec”, cap. 37, intitulado “Fertilidade Pedagógica”, que finaliza com estas palavras: "Nos planos e projetos apresentados aos membros do Parlamento, às Comissões encarregadas da reforma do ensino e à Universidade, nota-se que o autor se adiantara de muitos anos aos processos pedagógicos então em voga, aproximando-se, em diversos pontos, da “escola ativa”. Qual seria o objetivo desse Espírito ao tentar diminuir a estatura intelectual do Codificador?

— Por que Allan Kardec não teve filhos? — Ele era estéril. (pág. 45)
Na obra “Na Próxima Dimensão” o Espírito que se faz passar pelo insigne Dr. Inácio Ferreira diz o seguinte: (...) o casal havia renunciado a qualquer tipo de convivência mais íntima na esfera sexual, para devotar- se aos valores do espírito, e, tanto assim que ambos não geraram herdeiros diretos (...) (56). Parece que o “Dr. Inácio” ainda não se havia informado corretamente no Mundo Espiritual, ou será que esse que se apresenta como Chico está equivocado?

— Hoje, você se sente mais Chico Xavier ou Allan Kardec? — Ainda me sinto mais Chico Xavier. — Mas qual prefere sentir? — Ser Chico me agrada mais... — Por quê? — Está mais de acordo com o que me sinto ser. — Faltava um pouco de Chico a Kardec ou de Kardec a Chico? — Creio que de Chico a Kardec. (pág 47-48)
Mesmo que fosse verdadeira essa tese absurda, vê-se claramente que Chico Xavier não teria tanta falta de bom-senso a ponto de pôr mais lenha nessa fogueira que o “Dr. Inácio” reacendeu, em ação própria de Espíritos que querem desviar do estudo sério e do trabalho edificante as pessoas que se dedicam à Doutrina. Uma resposta como essa é a mais evidente negação da identidade de Chico Xavier, que sempre primou pela prudência, pelo equilíbrio, nunca entrando em discussões dessa natureza. Além do mais, vê-se outra tentativa de diminuir a figura do insigne Codificador.

— É natural, então, que, na atualidade, exista mais do médium na mediunidade do que da mediunidade no médium? — Sim, é natural, mas quem não possui bom senso não alcança esta compreensão. (pág. 79)
Depois de todas as admiráveis lições sobre mediunidade veiculadas através do Chico, num verdadeiro desdobramento de “O Livro dos Médiuns”, é possível se acredite possa ele agora participar de um diálogo tão primário e sem sentido como este? Bem, pelo mesmo médium, no livro “Do Outro Lado do Espelho”, o “Dr. Inácio” faz a seguinte afirmação, referindo- se aos médiuns: – Nós, os consideramos mortos, em matéria de mediunidade temos que nos contentar com percentagem: 30% nossos, 70% do médium... Quando, pelo menos, são 50% para cada lado, vá lá... Raro o médium que nos permite o empate. Isso sem falarmos nos médiuns que vivem colocando palavras inteiramente suas em nossos lábios: é um tal de termos dito, sem termos dito nada... (...) Os médiuns hoje querem improvisar... Quanta mistificação!..."(pág. 160)

— Como médium, Chico, na recepção das mensagens ditas particulares, você necessitava de um contato prévio com os familiares encarnados do espírito comunicante? —Ainda que fosse mínimo. — Com qual objetivo? — De estabelecer sintonia, facilitando o mecanismo que se coloca em funcionamento no diálogo que se estabelece entre encarnados e desencarnados. (pág. 70/71)
Esse Espírito sagaz vagarosamente vai ganhando a confiança do leitor para, repentinamente, dar um golpe dessa natureza, em que procura desmerecer a mediunidade de Chico Xavier, tentando igualá-la à de médiuns que agem dessa forma. Presenciei várias vezes em Pedro Leopoldo e em Uberaba, durante reuniões públicas, pessoas serem colhidas de surpresa, ao receberem mensagens de parentes desencarnados, quase desmaiando de emoção, pelo fato de ainda estarem esperando para terem um primeiro contato pessoal com o médium, quando lhes chegava a mensagem rica em detalhes particulares. Essa resposta, atribuída ao Chico, tem a finalidade exclusiva de diminuir o valor de sua obra consoladora, tentando nivelar tudo por baixo!

— Os médiuns devem consentir que a Ciência os investigue? — A Ciência materialista, não. Os métodos científicos com os quais se pretende investigar a autenticidade do fenômeno mediúnico não logram aferi-los subjetivamente. (pág. 72)
Não era essa a posição do Chico enquanto encarnado. Ele nunca se furtou, à investigação de quem quer que fosse. Agripino Grieco, na União Espírita Mineira, pesquisou à vontade a sua psicografia, em memorável encontro em que se comunicou Humberto de Campos. Há outros exemplos.

— Os espíritos, por si mesmos, podem produzir fenômenos? — Quanto mais intelectual a natureza do fenômeno, mais se impõe a necessidade da participação do médium. (pág. 75)
O médium declara publicamente que Chico foi a reencarnação de Kardec. Como, então, faz ele essa pergunta ao Codificador? Seria o caso de ele dizer que a resposta já foi dada há mais de um século, nas obras da Codificação. Além do mais, o que seria fenômeno intelectual? Seria psicofonia ou psicografia, em oposição a materialização? Depreende-se daí que quanto mais material é o fenômeno, menos é necessária a participação de um médium. Teria essa afirmativa a finalidade de justificar um caso de materialização sem o concurso de um médium, como foi apresentado na obra “Por Amor ao Ideal” (página 282-286)? Ali é afirmado que Edgar Alan Poe materializou-se sozinho. O ectoplasma usado para a produção do fenômeno teria sido retirado por ele próprio do cadáver de um bêbado, no cemitério, de onde teria caminhado até o consultório do Dr. Inácio.

— Certa vez, Emmanuel lhe disse que “não se tira nada de nada”... Que quer dizer? — Em seu contato com os homens, o conteúdo do espírito se subordina ao conteúdo do médium. (pág. 75/76)
Entendendo-se essa estranha expressão “conteúdo do espírito” como significando “cabedal evolutivo”, fica difícil entender essa subordinação do espírito aos conhecimentos do médium. Será que o “conteúdo” dos Espíritos que dialogaram com Kardec se subordinava ao das jovens Boudin?

— Como interpretarmos a verdadeira avalanche de livros espíritas que têm sido publicados? — Os espíritos, quanto os homens, têm o direito de apresentar o fruto de suas reflexões sobre a Vida além da morte. Cabe aos leitores avaliar a qualidade das obras editadas. (pág. 76)
Interessante notar que o “Dr. Inácio”, por esse mesmo médium, revela posição oposta, pois chegou a dar banana, não só na palavra, como também no gesto, para os espíritas que lhe criticaram a obra. “Fundação Emmanuel” (pág. 135)

— Você é contra ou a favor do abortamento, em casos em que o feto esteja se desenvolvendo sem cérebro? — Creio que o assunto seja pertinente ao livre arbítrio dos genitores, especialmente ao da mãe, mas, qual o significado se levar a termo uma gestação que, com os modernos recursos da Medicina, já se sabe de antemão comprometida do ponto de vista genético? Não seria penalizar, desnecessariamente, os familiares? — A Medicina, todavia, não pode cometer enganos? — Tudo o que é humano é passível de erro, mas não nos apoiemos em sofismas da inteligência para justificar pontos de vista extremistas que a Doutrina Espírita não defende. — Impedir de o espírito reencarnar-se em um corpo sem cérebro não seria frustrar-lhe a possibilidade de reajuste? — O espírito não reencarna em um corpo sem cérebro. (pág. 136-137)
O livro sob análise foi publicado em março de 2007. Nesse mesmo ano, apareceram nos jornais e na Internet casos de sobrevivência de anencéfalos, evidenciando a presença de Espíritos ligados a esses corpos. A Medicina pode detectar a inexistência de um cérebro normal, mas terá condições de detectar algumas células a que um Espírito esteja ligado? Quem pode afirmar que não se trata de caso semelhante àquele intitulado “Gestação Frustrada”, no cap.XIII, 2ª Parte, do livro “Evolução em dois Mundos”, ou seja, o funcionamento de um processo educativo para a mãe? Como interromper o processo, sem o conhecimento real das causas determinantes? O mesmo posicionamento em relação anencefalia e ao estupro foi defendido na obra “Fala, Dr. Inácio”. Agora, esse Espírito tenta respaldar-se no nome respeitável de Francisco Cândido Xavier...

— Se o corpo humano se estrutura a partir do corpo espiritual, como interpretar o caso do anencéfalo, ou seja, do feto que se desenvolve sem o órgão cerebral? — Na maioria das vezes, trata-se de um fenômeno pertinente às leis da matéria, constituindo-se em prova para os pais que, em vidas anteriores, não souberam honrar os compromissos em que agora se frustram. (pág. 138)
Quem garante que se trata de um fenômeno puramente material? E se o caso não estiver dentro dessa “maioria das vezes”? Admitindo-se constituir-se em prova para os pais, como interromper a prova? E se a mãe tiver de submeter-se ao parto como prática reeducativa, de treinamento para uma próxima gravidez?

— O caso do chamado anencéfalo que, aliás, tem sido muito debatido na atualidade, é uma questão genética ou espiritual? — A causa determinante, para os que nele se envolvem, é sempre de ordem espiritual. (pág. 138)
Se a causa determinante é sempre de ordem espiritual, como pode tratar-se de um fenômeno pertinente às leis da matéria, conforme dito acima?

— Em caso de estupro, é lícito o abortamento? — Em casos de estupro, a única vontade que deve prevalecer e ser respeitada é a da mulher que foi vítima de semelhante agressão. (pág. 140)
Nada foi perguntado a respeito de quem deve decidir sobre o abortamento ou a manutenção da gravidez. Atente-se para a falácia da resposta: ao invés de discutir a licitude do ato, declara o direito da mulher. Esse posicionamento é o mesmo contido na obra “Fala, Dr. Inácio” (pág. 128)

— O espírito que reencarna através de uma violência sexual que se consumou é inimigo da mãe? — Nem sempre; às vezes, inclusive, pode ser um espírito que tenha com a mãe laços de profunda afinidade espiritual. Nos casos de estupro, como em tantos outros de natureza provacional, há de se levar em consideração a chamada Lei de Compensação Cármica. — O que é a Lei de Compensação Cármica? — É o poder com que Deus facultou a Vida de transformar o Mal em Bem. (pág. 141)
Fica difícil entender como alguém que considera um estupro como acontecimento de natureza provacional – e considera essa Lei de Compensação Cármica – admita que a gravidez dele resultante possa ser interrompida sem novas e piores conseqüências.
Alongaríamos excessivamente este trabalho se fôssemos analisar todos os pontos que nos parecem duvidosos na obra. Não podemos comentar tudo, sem escrevermos um outro livro. Entretanto, alguns pontos devem ser ressaltados:
Francisco Cândido Xavier teve pouca escolaridade na sua última encarnação, mas sempre respondia com sabedoria, segurança e objetividade as perguntas que lhe eram formuladas. Quem o assistiu na televisão, ou leu os diálogos que, em várias ocasiões, ele manteve com jornalistas, deve fazer comparação com a pobreza das respostas que são registradas, em seu nome, na obra ora em análise. Em verdade, certas respostas só poderiam ser pobres, diante da trivialidade das perguntas.
Chico deixou pouca coisa escrita de sua lavra pessoal, mas não há nada que se compare à banalidade disso que está sendo atribuído a ele. Ao longo de sua vida, sua sabedoria foi-se revelando, sobrepondo-se à pouca escolaridade que teve na infância. Ele, como Espírito inteligente, dedicado, além de fazer vir à tona conhecimentos de sua bagagem espiritual, muito se enriqueceu na convivência com os Benfeitores que lhe usavam as faculdades e lhe partilhavam os dias.
Para aqueles que dizem ser ele a reencarnação de Kardec, a situação é mais delicada, pois se admitem que Chico tinha de ser assistido por Benfeitores Espirituais para responder as perguntas, face à sua pouca escolaridade na última encarnação, agora, com a memória integral, Chico / Kardec não responderia com profunda sabedoria? .
Se Chico Xavier foi a reencarnação de Kardec, fica difícil conciliar a trivialidade dos assuntos que lhe foram submetidos agora, e algumas respostas evasivas, com a postura do grande educador, sociólogo, teólogo, humanista, que teve capacidade para inquirir Espíritos Superiores sobre os assuntos pertinentes à Codificação, discutindo com eles, de igual para igual, a fim de codificar a Doutrina Espírita. É também difícil conciliar aquela nobre figura tão bem descrita por Humberto de Campos, no livro “Cartas e Crônicas” (cap. 28), com essa figura tão disponível para um bate-papo aqui na face da Terra. Ou seria nos Altos Planos de onde ele saiu para comparecer àquela memorável reunião na noite de 31 de dezembro de 1799? Ou será que o médium foi lá a fim de entrevistá-lo?
*José Passini é professor universitário, ex-reitor da Universidade Federal de Juiz de Fora, esperantista e colabora no movimento espírita de Juiz de Fora, Minas Gerais, Brasil.

quarta-feira, 24 de dezembro de 2014

O Natal diferente


Muito raro observar-se temperamento tão apaixonado, quanto o de Emiliano Jardim. 
No fundo, criatura generosa e sincera, mas as noções materialistas estragavam-lhe os pensamentos. Debalde cooperavam os amigos em renovar-lhe as ideias. O rapaz reportava-se a umas tantas teorias de negação, e a moléstia espiritual prosseguia do mesmo jeito. O casamento, realizado entre pompas familiares, em nada melhorara a situação; quando, porém, Emiliano experimentou a primeira dor da paternidade, ao ver o filho arrebatado pela morte, esse golpe profundo lhe abalou o espírito personalista.
Justamente por essa época, generoso padre meteu-lhe nas mãos um livro de consolação religiosa, à guisa de socorro.
Em semelhante fase do caminho, o contato com os ensinamentos de Jesus lhe encheu a alma de serena doçura. Estava deslumbrado. Como não compreendera antes a beleza da fé? Fez-se católico, sob aplausos gerais. Os afeiçoados se entreolhavam satisfeitos.
Emiliano, contudo, embora seduzido pelas verdades luminosas do Mestre, trazia a sua lição através da vida, como lhe acontecera ao tempo dos antigos postulados negativistas.
Acreditando servir ao ideal divino do Evangelho, terçava armas cruéis contra todos os que entendiam Jesus por prismas diferentes. Acusava os protestantes, malsinava os espíritas.
Os anos, porém, correram na sabedoria silenciosa do tempo.
Ralado pelas desilusões de todo homem que procura a felicidade longe da redenção de si mesmo, o nosso amigo, certo dia, passou-se de armas e bagagens para o Protestantismo.
Entretanto, por mais que se esforçassem os companheiros, Emiliano não conseguia realizar a visão interna do Cristo, como Divino Amigo de cada instante, através de seus imperecíveis ensinamentos.
Tornou-se anticlerical violento e rude. Esquecera todos os bens que a Igreja Católica lhe proporcionara, para recordar apenas suas deficiências, visíveis na imperfeição da criatura.
Alguns amigos menos vigilantes o felicitavam pelo desassombro; todavia, os mais experimentados reconheciam que o novo crente mudara a expressão religiosa exterior, mas não entregara o coração ao Cristo.
Depois de longa luta, Emiliano sente-se insatisfeito e ingressa nos arraiais espiritistas.
Emiliano, qual sucede à maioria dos crentes, admite a verdade, mas não dispensa os benefícios imediatos; dedica-se a Jesus, anseia por vê-lo nos outros homens, antes de senti-Lo em si próprio. Sua atividade geral transtorna-se. Enfrenta de armas na mão todos os companheiros antigos: Supõe que deve levar a defesa da nova doutrina ao extremo. A bondade dos guias espirituais, que se comunicam nas reuniões, ele a toma por elogio às suas atitudes.
Como, porém, a justiça esclarecida é sempre um credor generoso, que somente reclama pagamento depois de observar o devedor em condições de resgatar os antigos débitos, Emiliano, na posse de numerosos conhecimentos e bafejado de tantas exortações divinas, penetrou no caminho do resgate das velhas dívidas. Tempos difíceis surgiram-lhe no horizonte individual. Enquanto se esforçava para remover alguns obstáculos, outras montanhas de dificuldade apareciam, inesperadamente. A moléstia, a escassez de recursos e a ironia dos ingratos visitaram-lhe a casa honesta. A princípio resignado e forte, acabou desesperando-se. Dizia-se abandonado pelos amigos espirituais e acusava os médiuns, cheios de obrigações sagradas, tão-só porque não podiam permanecer em longas concentrações, para solução dos seus casos pessoais. Sentia-se perseguido por maus Espíritos, e, na sua inconformação, magoava companheiros respeitáveis.
A dor, todavia, não interrompeu sua função purificadora. Depois de penosa enfermidade, sua velha genitora partiu para a vida espiritual em condições amargas. Não passou muito tempo e a esposa, perturbada nas faculdades mentais durante três anos, seguia o mesmo caminho.
Em seguida, os dois filhos que criara, com excessos de carinho, se voltaram contra o coração paternal, com injustas acusações. Ao ensejo da calúnia, os últimos companheiros fugiram. O nosso amigo, outrora tão discutidor e tão violento, experimentou desânimo invencível. Nunca mais foi visto em rodas doutrinárias, nas tertúlias da inteligência; comumente era encontrado, como vagabundo vulgar, escondendo lágrimas furtivas. Numa radiosa véspera de Natal, em que o ambiente festivo lhe falava da ventura destruída ao coração, Emiliano chorou mais que de costume e resolveu pôr termo à existência.
À noite, encaminhou-se para a praia, alimentando o sinistro desígnio. Antes, porém, de consumar o erro extremo, pensou naquele Jesus que restituíra a vista aos cegos, que curara os leprosos, que amara os pobres e os desvalidos. Tais lembranças lhe nevoaram os olhos de pranto doloroso, modificando-lhe as disposições mais íntimas.
Foi aí, nessa hora amargurada em que o mísero se dispunha a agravar as próprias angústias, que uma voz suave se fez ouvir no recôndito de seu espírito:
- Emiliano, há quanto tempo eu buscava encontrar-te; mas sempre me chamavas através dos outros, sem jamais procurar-me em ti mesmo! Dá-me a tua dor, reclina a cabeça cansada sobre o meu coração!... Muitas vezes, o meu poder opera na fraqueza humana.
Raramente meus discípulos gozam o encontro divino, fora das câmaras do sofrimento.
Quase sempre é necessário que percam tudo a fim de me acharem em si mesmos. Tenho um santuário em cada coração da Terra; mas o homem enche esse templo divino de detritos, ou levanta muralhas de incompreensão entre o seu trabalho e a minha influência... Nessas circunstâncias, em vão me procuram. . .
Emiliano estava inebriado. Não ouvia propriamente uma voz idêntica à do mundo, mas experimentava o coração tomado por poderosa vibração, sentindo que as palavras lhe chegavam ao íntimo como aragem celestial.
Volta ao esforço diário e não te esqueças que estarei com os meus discípulos sinceros até ao  fim dos séculos! Acaso poderias admitir que permaneço em beatitude inerte, quando meu amigos se dilaceram pela vitória de minha causa? Não posso estacionar em vãs disputas, nem nas estéreis lamentações, porque necessitamos cuidar do amoroso esclarecimento das almas. É por isso que estou, mais frequentemente, onde estejam os corações quebrantados e os que já tenham 'compreendido a grandeza do espírito de serviço. Não te rebeles contra o sofrimento que purifica, aprende a deixar os bonecos a quantos ainda não puderam atravessar as fronteiras da infância. Não analises nunca, sem amar. Lembra-te de que, quando criticares teu irmão, também eu sou criticado. Ainda não terminei minha obra terrestre, Emiliano! Ajuda-me, compreendendo a grandeza do seu objetivo e entendendo a fragilidade dos teus irmãos. Dá o bem pelo mal, perdoa sempre! Volta ao teu esforço! Em qualquer posto de trabalho honesto poderás ouvir minha voz, desde que me procures no coração!...
Emiliano Jardim sentiu que as lágrimas agora eram de júbilo e reconhecimento.
Em breves instantes, experimentava radical transformação.
À sua frente via a imensidade do céu e a imensidade do oceano, sentindo-se como num mundo em que o Cristo houvera nascido. Recordou que não tinha senão escórias de miséria para ofertar a Jesus, e que seus sentimentos rudes simbolizavam aqueles animais que foram as primeiras visitas da manjedoura singela.
Deslumbrado, endereçou um pensamento de paz a todos os companheiros do pretérito e começou a compreender que cada um permanecia em sua posição de trabalho, na tarefa que o Senhor lhe designara. Poderosa vibração de amor ligava-o à Criação inteira. Não se torturava em raciocínios. Compreendia e chorava de júbilo. Levantou-se, enxugou as lágrimas e retomou o caminho da cidade barulhenta.
O nosso amigo conhecia de longos anos o Salvador, mas só agora encontrara o Mestre.
Emiliano Jardim regressou, renovado, ao labor do Evangelho, depois do Natal diferente.
(Reportagens de Além-Túmulo, Humberto de Campos, psicografia de Francisco Cândido Xavier)

sábado, 13 de dezembro de 2014

Seja voluntário


Seja voluntário na evangelização infantil.
Não aguarde convite para contribuir em favor da Boa Nova no
coração das crianças. Auxilie a plantação do futuro.
Seja voluntário no Culto do Evangelho.
Não espere a participação de todos os companheiros do lar para
iniciá-lo. Se preciso, faça-o sozinho.
Seja voluntário no templo espírita.
Não aguarde ser eleito diretor para cooperar. Colabore sem
impor condições, em algum setor, hoje mesmo.
Seja voluntário no estudo edificante.
Não espere que os outros lhe chamem a atenção. Estude por
conta própria.
Seja voluntário na mediunidade.
Não aguarde o desenvolvimento mediúnico, sistematicamente
sentado à mesa de sessões. Procure a convivência dos Espíritos
Superiores, amparando os infelizes.
Seja voluntário na assistência social.
Não espere que lhe venham puxar o paletó, rogando auxílio.
Busque os irmãos necessitados e ajude como puder.
Seja voluntário na propaganda libertadora.
Não aguarde riqueza para divulgar os princípios da fé. Dissemine,
desde já, livros e publicações doutrinárias.
Seja voluntário na imprensa espírita.
Não espere de braços cruzados a cobrança da assinatura. Envie
o seu concurso, ainda que modesto, dentro das suas possibilidades.
Sim, meu amigo. Não se sinta realizado.
Cultive espontaneidade nas tarefas do bem.
“A sementeira, é grande e os trabalhadores são poucos.”
Vivemos os tempos da renovação fundamental.
Atravessemos, portanto, em serviço, o limiar da Era do Espírito!
Ressoam os clarins da convocação geral para as fileiras do
Espiritismo.
Há mobilização de todos.
Cada qual pode servir a seu modo.
Aliste-se enquanto você se encontra válido.
Assuma iniciativa própria.
Apresente-se em alguma frente de atividade renovadora e sirva
sem descansar.
Quase sempre, espírita sem serviço é alma a caminho de tenebrosos
labirintos do umbral.
Seja voluntário na Seara de Jesus, Nosso Mestre e Senhor!
Cairbar Schutel
Livro O Espírito da Verdade, 
psicografia de Francisco Cândido Xavier e Waldo Vieira



Terrorismo de natureza mediúnica

                 Sutilmente vai-se popularizando uma forma lamentável de revelação mediúnica, valorizando as questões perturbadoras que devem receber tratamento especial, ao invés de divulgação popularesca de caráter apocalíptico.
         Existe um atavismo no comportamento humano em torno do Deus temor que Jesus desmistificou, demonstrando que o Pai é todo Amor, e que o Espiritismo confirma através das suas excelentes propostas filosóficas e ético-morais, o qual deve ser examinado com imparcialidade.
         Doutrina fundamentada em fatos, estudada pela razão e lógica, não admite em suas formulações esclarecedoras quaisquer tipos de superstições, que lhe tisnariam a limpidez dos conteúdos relevantes, muito menos ameaças que a imponham pelo temor, como é habitual em outros segmentos religiosos.
         Durante alguns milênios o medo fez parte da divulgação do Bem, impondo vinganças celestes e desgraças a todos aqueles que discrepassem dos seus postulados, castrando a liberdade de pensamento e submetendo ao tacão da ignorância e do primitivismo cultural as mentes mais lúcidas e avançadas...
         O Espiritismo é ciência que investiga e somente considera aquilo que pode ser confirmado em laboratório, que tenha caráter de revelação universal, portanto, sempre livre para a aceitação ou não por aqueles que buscam conhecer-lhe os ensinamentos. Igualmente é filosofia que esclarece e jamais apavora, explicando, através da Lei de Causa e Efeito,  quem somos, de onde viemos, para onde vamos, porque sofremos, quais são as razões das penas e das amarguras humanas... De igual maneira, a sua ética-moral é totalmente fundamentada nos ensinamentos de Jesus, conforme Ele os enunciou e os viveu, proporcionando a religiosidade que integra a criatura na ternura do seu Criador, sendo de simples e fácil formulação.
         Jamais se utiliza das tradições míticas greco-romanas, quais das Parcas, sempre tecendo tragédias para os seres humanos, ou de outras quaisquer remanescentes das religiões ortodoxas decadentes, algumas das quais hoje estão reformuladas na apresentação, mantendo, porém, os mesmos conteúdos ameaçadores.
         De maneira sistemática e contínua, vêm-se tornando comuns algumas pseudorrevelações alarmantes, substituindo as figuras mitológicas de Satanás, do Diabo, do Inferno, do Purgatório, por Dragões, Organizações demoníacas, regiões punitivas atemorizantes, em detrimento do amor e da misericórdia de Deus que vigem em toda parte.
         Certamente existem personificações do Mal além das fronteiras físicas, que se comprazem em afligir as criaturas descuidadas, assim como lugares de purificação depois das fronteiras de cinza do corpo somático, todos, no entanto, transitórios, como ensaios para a aprendizagem do Bem e sua fixação nos painéis da mente e do comportamento.
         O Espiritismo ressuscita a esperança e amplia os horizontes do conhecimento exatamente para facultar ao ser humano o entendimento a respeito da vida e de como comportar-se dignamente ante as situações dolorosas.
         As suas revelações objetivam esclarecer as mentes, retirando a névoa da ignorância que ainda permanece impedindo o discernimento de muitas pessoas em torno dos objetivos essenciais da existência carnal.
         Da mesma forma como não se deve enganar os candidatos ao estudo espírita, a respeito das regiões celestes que os aguardam, desbordando em fantasias infantis, não é correto derrapar nas ameaças em torno de fetiches, magias e soluções miraculosas para os problemas humanos, recorrendo-se ao animismo africanista, de diversos povos e às suas superstições. No passado, em pleno período medieval, as crenças em torno dos fenômenos mediúnicos revestiam-se de místicas e de cerimônias cabalísticas, propondo a libertação dos incautos e perversos das situações perniciosas em que transitavam.
         O Espiritismo, iluminando as trevas que permanecem dominando incontáveis mentes, desvela o futuro que a todos aguarda, rico de bênçãos e de oportunidades de crescimento intelecto-moral, oferecendo os instrumentos hábeis para o êxito em todos os cometimentos.
         A sua psicologia é fértil de lições libertadoras dos conflitos que remanescem das existências passadas, de terapêuticas especiais para o enfrentamento com os adversários espirituais que procedem do ontem perturbador, de recursos simples e de fácil aplicação.
         A simples mudança mental para melhor proporciona ao indivíduo a conquista do equilíbrio perdido, facultando-lhe a adoção de comportamentos saudáveis que se encontram exarados em O Evangelho segundo o Espiritismo, de Allan Kardec, verdadeiro tratado de eficiente psicoterapia ao alcance de todos que se interessem pela conquista da saúde integral e da alegria de viver.
         Após a façanha de haver matado a morte, o conhecimento do Espiritismo faculta a perfeita integração da criatura com a sociedade, vivendo de maneira harmônica em todo momento, onde quer que se encontre, liberada de receios injustificáveis e sintonizada com as bênçãos que defluem da misericórdia divina.
         A mediunidade, desse modo, a serviço de Jesus, é veículo de luz, de seriedade, dignificando o seu instrumento e enriquecendo de esperança e de felicidade todos aqueles que se lhe acercam.
         Jamais a mediunidade séria estará a serviço dos Espíritos zombeteiros, levianos, críticos, contumazes de tudo e de todos que não anuem com as suas informações vulgares, devendo tornar-se instrumento de conforto moral e de instrução grave, trabalhando a construção de mulheres e de homens sérios que se fascinem com o Espiritismo e tornem as suas existências úteis e enobrecidas.
         Esses Espíritos burlões e pseudossábios devem ser esclarecidos e orientados à mudança de comportamento, depois de demonstrado que não lhes obedecemos, nem lhes aceitamos as sugestões doentias, mentirosas e apavorantes com as histórias infantis sobre as catástrofes que sempre existiram, com as informações sobre o fim do mundo, com as tramas intérminas a que se entregam para seduzir e conduzir os ingênuos que se lhes submetem facilmente...
         O conhecimento real do Espiritismo é o antídoto para essa onda de revelações atemorizantes, que se espalha como um bafio pestilencial, tentando mesclar-se aos paradigmas espíritas que demonstraram desde o seu surgimento a legitimidade de que são portadores, confirmando o Consolador que Jesus prometeu aos seus discípulos e se materializou na incomparável Doutrina.
         Ante informações mediúnicas desastrosas ou sublimes, um método eficaz existe para a avaliação correta em torno da sua legitimidade, que é a universalidade do ensino,  conforme estabeleceu o preclaro Codificador.
         Desse modo, utilizando-se da caridade como guia, da oração como instrumento de iluminação e do conhecimento como recurso de libertação, os adeptos sinceros do Espiritismo não se devem deixar influenciar pelo moderno terrorismo de natureza mediúnica, encarregado de amedrontar, quando o objetivo máximo da Doutrina é libertar os seus adeptos, a fim de os tornar felizes.
Vianna de Carvalho
Página psicografada pelo médium Divaldo Pereira Franco, no
dia 7 de dezembro de 2009, durante o XVII Congresso Espírita
Nacional, em Calpe, Espanha.
Em 09.04.2012.








sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

O episódio de Hydesville parte 1

 As ocorrências de comunicações de um espírito no vilarejo de Hydesville, condado de Wayne, Estado de Nova York, contam com declarações assinadas pela  sra. Margaret Smith Fox e pelo sr.John David Fox e muitas outras testemunhas.

Depoimento da Sra. Margaret Fox, esposa de John David Fox - ferreiro.

 Nós alugamos este sítio a partir de 11 de dezembro de 1847, quando mudamos para a vila de Hydesville. Nosso endereço oficial é na cidade de Rochester [a casa da família em Rochester estava passando por uma reforma]. Há quinze dias atrás ouvimos os barulhos pela primeira vez. Parecia inicialmente tratar-se de alguém batendo no chão de um dos quartos de dormir; às vezes soava como se uma cadeira estivesse sendo arrastada pelo chão, mas era impossível localizar exatamente onde o ruído ocorria. Isto aconteceu de noite, logo depois de termos ido para a cama. A família dormia num único quarto e todos ouvimos o ruído. Algumas noites estávamos em quatro pessoas; outras vezes, em cinco. Na primeira noite que ouvimos o ruído, todos levantamos e acendemos uma vela, e começamos a vistoriar a casa. O ruído continuou enquanto estávamos procurando, e surgia sempre perto do mesmo lugar. Não era um ruído muito alto, mas ainda assim causava uma vibração possível de ser sentida colocando-se a mão sobre uma cadeira ou também nos estrados das camas onde estivéssemos deitados. Era um tipo de tremor, bem mais forte do que uma simples vibração. Quando estávamos de pé podíamos sentir perfeitamente esses tremores no chão. Os ruídos continuaram e resolvemos tentar dormir. Eu só consegui dormir por volta da meia noite. Mas houve ruídos a noite toda.
 Na noite de quinta-feira, dia 31 de março, o ruído voltou da mesma forma e então resolvemos chamar os vizinhos. Até aquele momento os ruídos só tinham aparecido de noite, ou pelo menos esse era o horário em que nós os tínhamos percebido. Resolvemos ir para a cama mais cedo, e combinamos que não iríamos nos deixar incomodar pelos sons; se eles ocorressem, nós não nos deixaríamos perturbar, pois todos estávamos precisando de uma noite de sono regular. Meu esposo esteve conosco em todas essas ocasiões, e ele também ouviu os ruídos e ajudou a investigar. Fomos bem cedo pra cama e estava muito escuro. Eu tinha perdido tanto o sono na noite anterior que eu já estava me achando um pouco doente. Meu marido ainda não tinha ido para a cama quando os ruídos voltaram. Eu tinha recém me deitado. Começou do mesmo jeito de sempre. Eu reconhecia aquele som porque era diferente de qualquer outro ruído que eu já tivesse ouvido naquela casa. As minhas filhas que dormiam na outra cama, ao ouvirem o ruído, tentaram fazer um som parecido estalando os dedos. A minha filha mais nova de 12 anos – foi ela que começou a fazer barulhos  com as mãos. No mesmo instante que ela fazia um ruído, fosse estalando os dedos, ou batendo palmas, acontecia uma repetição do ruído no quarto. Era o mesmo tipo de ruído, só que agora ele estava repetindo o número de sons que ela fazia. Quando ela parou de fazer sons, o ruído também ficou em silêncio.
   Minha outra filha de 15 anos resolveu experimentar batendo palmas, e por brincadeira disse:

       - agora faça como eu faço - bata um, dois, três, quatro!

 Os sons que ela produziu foram repetidos por ruídos e tínhamos certeza que o ruído estava respondendo para ela, pois ele repetia exatamente o número de palmas que ela batia. Ela não quis repetir a experiência porque ficou muito assustada.
  Então eu falei para o ruído: conte até dez! e ele fez dez ruídos.
Aí perguntei a idade dos meus filhos, um de cada vez, e ele deu o número de batidas que correspondiam corretamente a cada uma das idades deles. Então perguntei se era um ser humano que fazia aqueles ruídos? e se fosse, que fizesse um ruído, mas não ouvimos nenhum som. Então perguntei se era um espírito? e se fosse, que desse duas batidas.  Assim que terminei de falar ouvidos dois sonsEntão eu perguntei se era um espírito assassinado? que respondesse com um som, e ouvi um ruído bem nítido.
Perguntei se tinha sido morto nesta casa? e ele confirmou com um ruído.
Se a pessoa que o matou ainda vivia? e ele confirmou que sim.  Usando esse método eu descobri que os restos mortais dele foram enterrados embaixo da casa, e ele também me disse a idade dele. Quando eu perguntei quantos anos ele tinha? ele bateu 31 vezes;
que ele era um homem; que ele tinha deixado uma família de cinco filhos, que ele tinha dois filhos e três filhas, todos vivos.
Eu perguntei se ele deixou uma esposa? e ele bateu afirmativamente. Se sua esposa era viva? nenhum som; se ela estava morta? e soou um ruído;  há quanto tempo ela tinha morrido? e ele fez dois ruídos.
 Nesse momento eu perguntei, se os sons continuariam caso eu chamasse meus vizinhos para eles também ouvirem? Ele respondeu com um ruído. Meu marido saiu e foi chamar a vizinha do lado, a sra. Redfield. Ela é uma mulher muito sincera. As meninas permaneceram sentadas na cama e, atemorizadas, estavam abraçando-se uma à outra. Eu estava bem calma, do mesmo jeito que estou agora ao dar este depoimento.
  A sra. Refdield veio imediatamente. Já era sete e meia da noite. Ela veio pensando que iria rir das meninas; mas quando ela chegou, viu que estávamos todos espantados e que tinha alguma coisa acontecendo de verdade. Eu, então, fiz algumas perguntas que foram respondidas com ruídos, como antes; e ela se convenceu de que havia alguma coisa real acontecendo. Ele acertou a idade dela.

quinta-feira, 4 de dezembro de 2014

A imortalidade do ser humano - por Marta Antunes Moura

A crença na imortalidade é, segundo Léon Denis (1846-1927,  uma das “[...] mais difundidas nas filosofias e nas religiões do Oriente e do Ocidente. Do ponto de vista filosófico pode assumir duas formas diferentes: 1ª a crença na imortalidade da pessoa individual, ou seja, da alma humana em sua totalidade; 2º a  crença na imortalidade daquilo que a pessoa individual tem em comum com um princípio eterno e divino, só da parte impessoal da alma.” 1 Para o filósofo grego Platão (428/427-348/347), esta crença “[...] é o laço de toda a sociedade; despedaçai esse laço e a sociedade se dissolverá.”2
O conceito de existência e sobrevivência da alma  é admitido desde os tempos imemoriais, mas foi consolidado com as ideias de Sócrates, Platão, Pitágoras e dos filósofos órficos. Divulgado na Idade Média, foi acrescido das interpretações da teologia cristã pelos pais da Igreja, como Agostinho e Tomás de Aquino. No Renascimento o conceito era lugar comum, amplamente divulgado. Na Idade moderna sofreu uma reviravolta, sobretudo com a chegada do positivismo de Auguste Comte (1798-1857) que, com a sua doutrina do culto à razão,  rejeitava Deus e a imortalidade da alma. Na Idade Contemporânea, o conhecimento humano progride vertiginosamente e, com o desenvolvimento da Psicologia e da Parapsicologia, o mundo científico passa a se interessar pela paranormalidade, aceitando-se que o homem possui algo de transcendental, preexistente à formação do corpo físico.
Mais tarde, os Fenômenos de Quase Morte se destacam, sobretudo os trabalhos conduzidos por Elisabeth Kübler-Ross (1926-2004), médica suíça naturalizada americana. Esta respeitável psiquiatra obteve importantes observações de pacientes terminais que retornaram ao corpo após parada cardíaca ou estado comatoso. A maioria desses pacientes não só relataram aspectos da vida além da matéria e o encontro com Espíritos já falecidos, como puderem, por si mesmos, atestarem a imortalidade do Espírito.
As pesquisas desenvolvidas pelo psiquiatra canadense, Ian Stevenson (1918-2007), ao longo de décadas e em diferentes partes do mundo, acumularam um número significativo de casos de pessoas que tinham reminiscências de outras existências e de experiências vividas no plano espiritual, após a morte do corpo.
Segundo a Doutrina Espírita, “[...] chamamos alma ao ser imaterial e individual que reside em nós e sobrevive ao corpo .[...].” A questão de aceitar, ou não,  imortalidade da alma, e consequentemente a sua capacidade de se comunicar com os encarnados, reside na ideia que se tem de alma. Para muitos indivíduos, a alma é uma abstração, para outros é um ser destituído de uma forma precisa, espécie de luz ou clarão. Outros têm uma visão confusa, com base em suas convicções  religiosas. O progresso da Ciência, contudo, permitirá que o a imortalidade da alma, sua sobrevivência e manifestação no plano físico sejam comprovados.
A sobrevivência da alma depois da morte está provada, de maneira irrecusável e de alguma sorte palpável, pelas comunicações espíritas. Sua individualidade está demonstrada pelo caráter e pelas qualidades próprias de cada uma; essas qualidades, distinguindo as almas umas das outras, constituem a sua personalidade; se elas estivessem confundidas num todo comum, não teriam senão qualidades uniformes. Além dessas provas inteligentes, há ainda a prova material das manifestações visuais, ou aparições, que são tão frequentes e tão autênticas, que não é permitido contradizer. 4
Referências
1.    DENIS, LÉON. Cristianismo e espiritismo.  7 ed. Rio de Janeiro: FEB, cap. XI, p. 238.
2.    ABBAGNAN0, Nicola. Dicionário de filosofia. Tradução de Alfredo Bosi e Ivone Castilho Benedetti. 4 ed. São Paulo: Martins Fontes, 2000, p. 542.
3.    KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. Tradução de Evandro Noleto Bezerra. 2 ed. Rio de Janeiro: FEB, 2010. Introdução II, p.25.

4.    DENIS, LÉON. Depois da morte. 13 ed. Segunda  parte, cap X,  p.127 a 132.